RECURSO
ESPECIAL Nº 109.396 - RS (1996⁄0061722-8) – DJ 04/08/2003
RELATOR
: MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
RECORRENTE : BANCO DO BRASIL S⁄A
ADVOGADO : LEÔNIDAS CABRAL DE
ALBUQUERQUE E OUTROS
RECORRIDO : CALCADOS MORGANA LTDA -
MASSA FALIDA
REPR.POR : OSWALDO BALPARDA -
SÍNDICO
EMENTA
FALÊNCIA. PREFERÊNCIAS.
RESTITUIÇÃO DE ADIANTAMENTO EM CONTRATO DE CÂMBIO. CRÉDITOS
TRABALHISTAS. ORIENTAÇÃO DA SEGUNDA SEÇÃO. RECURSO
ACOLHIDO.
– Nos termos
da orientação que veio a prevalecer no âmbito da Segunda
Seção, as restituições oriundas de adiantamento
de contrato de câmbio devem efetivar-se antes do pagamento de
qualquer crédito, ainda que trabalhista.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, retificando a proclamação feita em 15.4.2003, prosseguindo
no julgamento, após o voto-vista do Ministro Sálvio de Figueiredo
Teixeira, reafirmando o entendimento anterior, e o voto do Ministro Ruy Rosado
de Aguiar, retificando o voto proferido na assentada de 16.5.2000, com ressalva,
acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça,
na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por
maioria, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Vencido o Ministro Cesar
Asfor Rocha. Votaram com o Relator os Ministros Barros Monteiro e Ruy Rosado
de Aguiar. Presidiu a Sessão o Ministro Aldir Passarinho Junior.
Brasília, 20 de maio de 2003(data do julgamento).
MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
Relator
RECURSO ESPECIAL Nº 109.396 - RS (1996⁄0061722-8)
RECORRENTE-:-BANCO DO BRASIL S⁄A
ADVOGADO-:-LEÔNIDAS CABRAL DE ALBUQUERQUE E OUTROS
RECORRIDO -:-CALCADOS MORGANA LTDA - MASSA FALIDA
REPR.POR -:-OSWALDO BALPARDA - SÍNDICO
EXPOSIÇÃO
SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA:
Contra a decisão que, em processo de falência, determinou a
preferência dos créditos trabalhistas sobre os pedidos de restituição
em contrato de câmbio, interpôs agravo o ora recorrente.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul negou provimento ao recurso,
tendo o acórdão recebido esta ementa:
“Agravo. Direito Falimentar. Preferência dos créditos trabalhistas
em relação aos créditos decorrentes de restituição
fundada em adiantamento de câmbio. Segundo orientação
predominante nesta Câmara, os créditos trabalhistas têm
prioridade sobre os demais créditos. Voto vencido”.
Insurgiu-se o credor agravante pela via do recurso especial de que ora se
cuida, fundamentado na alínea a do art. 105-III da Constituição,
argumentando com afronta aos arts. 75, § 3º da Lei 4.728⁄65 (Lei
do Mercado de Capitais), 78 da Lei de Falências (Decreto-Lei nº
7.661⁄45) e 5º-XXXVI da Constituição.
Contra-arrazoado, logrou o recurso ser admitido, por entender o Presidente
daquela Corte revestirem-se as razões recursais de “razoabilidade”,
indo “ao encontro da jurisprudência do Col. Superior Tribunal de Justiça”,
da qual destacou as ementas dos REsp's 56.133-RS, relatado pelo Ministro Waldemar
Zveiter e 10.021-SP, que relatei.
Foi também interposto pelo banco recurso extraordinário, inadmitido
em decisão que transitou em julgado.
É o relatório.
VOTO
SR. MINISTRO
SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA(Relator):
1. Cumpre afastar,
de plano, o cabimento do recurso no que diz com a invocada violação
do texto constitucional, haja vista a incompetência desta Corte para
o exame de matéria dessa natureza, sendo certo que lhe cabe o papel
de guardião do direito federal de índole infraconstitucional,
preservando a sua autoridade e uniformizando a sua interpretação
no território nacional.
2. Quanto à
matéria de fundo, vinha ela sendo decidida pelas Terceira e Quarta
Turmas segundo a orientação exposta pelo em. então Presidente
do Tribunal de origem, Des. Adroaldo Furtado Fabrício, ao exercer
o juízo de admissibilidade do recurso. Tal posicionamento veio a ser
consolidado pela Segunda Seção, no julgamento do REsp 32.959-SP.
Nesse precedente assentou-se a preferência dos créditos trabalhistas
sobre todos os demais, mas esclarecendo que as restituições,
por não constituírem propriamente crédito, mas bens
de terceiros em poder do falido, devem ser atendidas em primeiro lugar, ressalvando-se
as contribuições previdenciárias retidas pelo falido
e não repassadas à seguridade social, no período decorrido
entre a edição do Decreto-Lei 66⁄66 e a entrada em vigor da
Lei 8.212⁄91, em que tais verbas eram consideradas como crédito da
União, e não restituição.
3. No voto-vista
que proferi naquele julgamento, assinalei:
“No concernente
às contribuições previdenciárias retidas pela
falida, mantenho o posicionamento que sufraguei no julgamento do referido
Resp 23.642-7⁄SP, acompanhando o voto do seu Relator , que expressou:
“Quanto ao
pedido de restituição do IAPAS, tem razão o recorrente
ao mostrar a inexistência de tal direito.
Nos termos
do art. 51, da Lei 8.212, de 24.07.91 (Lei Orgânica da Previdência
Social):
'O crédito
relativo a contribuições, cotas e respectivos adicionais ou
acréscimos de qualquer natureza arrecadados pelos órgãos
competentes, bem como a atualização monetária e os juros
de mora estão sujeitos, nos processos de falência, concordata
ou concurso de credores, às disposições atinentes aos
créditos da União, aos quais são equiparados.
Parágrafo
único. O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) reivindicará
os valores descontados pela empresa de seus empregados ainda não recolhidos'.
Este Tribunal,
através da Eg. 3ª Turma, sendo relator o eminente Min. Nilson
Naves, já teve oportunidade de decidir pela prioridade do credito
salarial sobre o pedido de restituição do INSS:
'Falência.
Classificação dos créditos. Restituição.
Não ofendeu os arts. 102 da Lei de Falências e 499, §
1º da Consolidação das Leis do Trabalho, acórdão
que, para o rateio, estabeleceu, no ponto de interesse destes autos, a seguinte
ordem: a)crédito trabalhista, compreendendo salários e horas
extras devidos aos ex-empregados da falida; b) restituição devida
ao IAPAS; c) crédito trabalhista, compreendendo indenizações,
férias, etc. Recurso especial não conhecido'. (Resp 11.067-0⁄SP,
rel. em. Min. Nilson Naves, DJU 22⁄06⁄92)'.
Também
o Eg. Supremo Tribunal Federal assumiu o mesmo posicionamento:
'1) A Súmula
nº 417 (restituição de dinheiro em falência) aplica-se
às contribuições de previdência dos empregados
retidas pelo falido (RE 18.635, ERE 32.210, RE 52.249, RE 43.309). 2)Entretanto,
se os salários não chegaram a ser pagos, só após
esse pagamento tem lugar a restituição a instituição
previdenciária, se a massa tiver recursos'. (RE 59.100, rel. em. Min.
Victor Nunes, DJU 08⁄03⁄67).
No caso, segundo
afirmado pelo requerente, sem contestação (fl ),trata-se
de crédito salarial.
3. Por tais
razões, penso que o v. acórdão violou as disposições
dos arts. 102 e 124 da Lei de Falências, e dou provimento ao recurso
para ordenar o pagamento preferencial do credor salarial trabalhista”.
Acrescento
que, no particular, já expressei entendimento no sentido de que a
restituição, porque não propriamente crédito mas
devolução ao proprietário de coisa que não integrava
o patrimônio do falido, deveria ser feita antes do pagamento a qualquer
credor, por mais privilegiado que fosse. Do voto que proferi como relator
do Resp 10.021-SP(DJU 03⁄05⁄93), versando tema assemelhado, fiz constar:
“A restituição,
contudo, não pode ser equiparada a crédito. Trata-se simplesmente
de devolução de coisas - e, em sua falta, do correspondente
em dinheiro(art. 78, § 2º)- que, embora arrecadadas em poder do
falido, não integravam seu patrimônio. Característicos
bens de terceiro. Nessa diretriz, o magistério de Rubens Requião,
referido na decisão impugnada e no parecer do Parquet federal:
"Em síntese,
o primeiro efeito do pedido é, precisamente, a suspensão da
disponibilidade da coisa, e, em seguida, a restituição, exista
em espécie ou tenha sido sub-rogada por outra. Não existindo,
nem uma nem outra, por ter sido vendida ou consumida, restitui-se o respectivo
preço. A restituição do valor, expresso no preço,
deve ser pago desde logo, fora do rateio, antes de qualquer credor, mesmo
privilegiado, pois constitui valor de terceiro, resultante de sua propriedade
privada, que deve ser preservada"("Curso de Direito Falimentar", 1º vol.,
Saraiva, 13ª ed., 1989, nº 225, p. 246⁄247)”.
4. O Relator
daquele julgado, Ministro Eduardo Ribeiro, por seu turno, no particular anotou:
“Por fim, as
restituições.
Tem-se como
certo, em regra, que não se confundem com o pagamento de credores.
E a jurisprudência deste Tribunal é tranqüila no sentido
de que essa se faz sem que haja cogitar de concurso. Assim decidiu a Terceira
Turma, no julgamento do REsp 12.100 (rel. Cláudio Santos, DJ 28⁄09⁄92),
e a Quarta, ao apreciar o REsp 10.021 (rel. Sálvio de Figueiredo,
DJ de 03.05.93). Trata-se de bens de terceiros, em poder do falido, ou de
situações que a lei a isso equiparou.
Menciona-se,
no recurso, que nem todas as restituições se justificavam. Isso
não pode ser aqui suscitado. Haveria de sê-lo quando foram requeridas.
Nessa fase apenas se decidirá sobre a preferência das que foram
deferidas.
A dúvida
se coloca, entretanto, quando a hipótese diz com as contribuições
dos empregados, devidas à Previdência, não recolhidas
pelo empregador.
A jurisprudência
do Supremo Tribunal Federal era no sentido de que tais contribuições,
retidas pelo empregador, pertenciam à entidade previdenciária
e lhe deviam, pois, ser entregues. Tratando-se de restituição,
não haveria lugar para rateio nem se cogitaria de eventuais preferências.
Desse modo, ainda fosse a hipótese de crédito trabalhista,
primeiro se faria a transferência das contribuições.
Exemplo desse entendimento se encontra no acórdão, juntado
aos autos, relativo ao RE 101.333, relatado pelo Ministro Rafael Mayer, e
onde se faz menção a numerosos precedentes no mesmo sentido.
Observe-se que não se afasta de tal sentir a decisão proferida
no RE 59.100 (rel. Victor Nunes, RTJ 40⁄491). Ali se teve em conta uma peculiaridade.
Os salários não haviam sido pagos. Em relação
a esses não se fizera, obviamente, a retenção. Daí
que não havia falar em restituição. A regra de que as
contribuições retidas devem ser restituídas foi, entretanto,
reafirmada.
Neste Tribunal
tem-se decidido que as restituições em geral - não especificamente
as pertinentes a contribuições previdenciárias retidas
- devem ser feitas antes do pagamento de quaisquer créditos, inclusive
trabalhistas, pois têm natureza distinta desses. Explicitou-o o Ministro
Sálvio de Figueiredo ao votar no julgamento do REsp 10.021:
“É certo,
e em momento algum se negou, que o crédito trabalhista goza de privilégio,
em relação aos demais créditos, preferindo inclusive
ao pagamento dos encargos e dívidas da massa.
A restituição,
contudo, não pode ser equiparada a crédito. Trata-se simplesmente
de devolução de coisas - e, em sua falta, do correspondente
em dinheiro(art. 78, § 2º)- que, embora arrecadadas em poder do
falido, não integravam seu patrimônio. Característicos
bens de terceiro.”
No mesmo sentido
os Recursos Especiais 12.100 (rel. Cláudio Santos, DJ 28.09.92) e
56.133 (rel. Waldemar Zveiter, DJ 21.08.95).
Em relação
às contribuições em exame, entendeu-se que seriam objeto
de restituição, no julgamento do REsp 2.135 (rel. Waldemar
Zveiter, DJ 06.08.90)”.
O mencionado
acórdão da Segunda Seção acabou por receber esta
ementa:
“Falência.
Créditos trabalhistas. Preferências.
Após
as Leis 3.726⁄60 e 6.449⁄77, os créditos trabalhistas preferem a todos
os demais, inclusive os relativos a custas, dívidas e encargos da
massa. Na categoria daqueles, entretanto, se haverão de incluir os
oriundos da prestação de serviço à massa.
Restituições.
Devem efetivar-se
antes do pagamento de qualquer crédito, ainda que trabalhista, pois
os bens a que se referem não integram o patrimônio do falido.
As contribuições
previdenciárias descontadas dos salários e retidas pelo empregador
sujeitam-se a esse regime, devendo ser entregues à Previdência.
Excetuam-se
as relativas ao período posterior à vigência do Decreto-lei
66⁄66 e até a entrada em vigor da Lei 8.212⁄91, quando aquelas contribuições
gozaram apenas do privilégio atribuído aos tributos de competência
da União, havendo de ser atendidas após os créditos
trabalhistas”(negritei).
Posteriormente,
esta Quarta Turma, julgando o REsp 90.068-SP, por mim relatado, adotou idêntica
orientação, restando o acórdão então proferido
resumido nesta ementa:
“Falência.
Preferências. Restituição ao INSS das contribuições
previdenciárias descontadas dos salários pelo falido e não
repassadas à seguridade social. Créditos trabalhistas. Custas.
Dívidas. Encargos da massa. Orientação da 2ª Seção.
Recurso acolhido.
I – Após
as Leis 3.726⁄60 e 6.449⁄77, os créditos trabalhistas detêm
preferência sobre os demais, inclusive os relativos a custas, dívidas
e encargos da massa. Entende a Segunda Seção, entretanto, que
na categoria de créditos trabalhistas se incluem os oriundos da prestação
de serviços à massa.
II – As restituições
devem efetivar-se antes do pagamento de qualquer crédito, ainda que
trabalhista, posto referir-se a bens que não integram o patrimônio
do falido.
III – As contribuições
previdenciárias descontadas dos salários e retidas pelo empregador
constituem bens da previdência, que não integram o patrimônio
do falido, sujeitando-se ao regime das restituições, devendo
ser entregues à credora com prioridade absoluta.
IV – Exceção
a essa regra constituem as contribuições relativas ao período
posterior à vigência do Decreto-Lei 66⁄66 até a entrada
em vigor da Lei 8.212⁄91, tempo em que tais verbas gozaram apenas do privilégio
atribuído aos tributos de competência da União, havendo
de ser atendidas após os créditos trabalhistas”(negritei).
5. Na linha
do decidido pela Seção, logra, portanto, ser conhecido o recurso,
pela apontada violação do art. 78-§ 3º da Lei de
Falências, e provido, para o fim de determinar-se a restituição
das importâncias relativas a adiantamentos em contrato de câmbio,
reclamadas pelo recorrente, com preferência até mesmo sobre os
créditos trabalhistas.
CERTIDÃO
DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número
Registro: 1996⁄0061722-8-RESP 109396 ⁄ RS
Números
Origem: 343400 595183195
PAUTA: 19⁄03⁄1998-JULGADO:
19⁄03⁄1998
-
Relator
Exmo. Sr. Ministro
SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
Presidente
da Sessão
Exmo. Sr. Ministro
BARROS MONTEIRO
Subprocurador-Geral
da República
Exmo. Sr. Dr.
WALLACE DE OLIVEIRA BASTOS
Secretária
Bela. CLAUDIA
AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
AUTUAÇÃO
RECORRENTE
: BANCO DO BRASIL S⁄A
ADVOGADO
: LEÔNIDAS CABRAL DE ALBUQUERQUE E OUTROS
RECORRIDO
: CALCADOS MORGANA LTDA - MASSA FALIDA
REPR.POR
: OSWALDO BALPARDA - SÍNDICO
ASSUNTO: Comercial
- Falência - Restituição - Dinheiro
CERTIDÃO
Certifico que
a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Apos os votos
dos Srs. Ministros Relator e Barros Monteiro,conhecendo do recurso, mas lhe
negando provimento, pediu VISTA o Sr.Ministro Cesar Asfor Rocha.
Aguarda o Sr.
Ministro Ruy Rosado de Aguiar.
Ausente, ocasionalmente,
o Sr. Ministro Bueno de Souza.
O referido
é verdade. Dou fé.
Brasília,
19 de março de 1998
CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE
BECK
Secretária
RECURSO ESPECIAL
Nº 109.396 - RS (1996⁄0061722-8)
EMENTA
COMERCIAL.
FALÊNCIA. RESTITUIÇÕES DE ADIANTAMENTO DE CONTRATOS DE
CÂMBIO. PREFERÊNCIA DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS.
O adiantamento
de contrato de câmbio constitui-se num incentivo à exportação,
constante do financiamento concedido ao exportador, a fim de proporcionar-lhe
recursos para a produção e comercialização de
seus produtos. Traduz-se, portanto, num empréstimo para capital de
giro.
A previsão
de sua restituição não passa de mera garantia, por isso
não se pode admitir que venha a ter preferência sobre os créditos
trabalhistas, com descabido e exacerbado protecionismo às instituições
financeiras, em detrimento das verbas laborais dos ex-empregados do falido,
que se revestem de natureza eminentemente alimentar.
A dignidade
humana e a dignidade do trabalho estão em plano valorativo superior
ao interesse de incentivo das exportações.
Recurso não
conhecido.
VOTO-VISTA (Vencido)
O EXMO. SR.
MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA:
01. O eminente
Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira assim relatou o feito:
"Contra a decisão
que, em processo de falência, determinou a preferência dos créditos
trabalhistas sobre os pedidos de restituição em contrato de
câmbio, interpôs agravo o ora recorrente.
O Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul negou provimento ao recurso, tendo
o acórdão recebido esta ementa:
'Agravo. Direito
Falimentar. Preferência dos créditos trabalhistas em relação
aos créditos decorrentes de restituição fundada em adiantamento
de câmbio. Segundo orientação predominante nesta Câmara,
os créditos trabalhistas têm prioridade sobre os demais créditos.
Voto vencido'.
Insurgiu-se
o credor agravante pela via do recurso especial de que ora se cuida, fundamentado
na alínea a do art. 105-III da Constituição, argumentando
com afronta aos arts. 75, § 3º da Lei 4.728⁄65 (Lei do Mercado
de Capitais), 78 da Lei de Falências (Decreto-Lei nº 7.661⁄45)
e 5º-XXXVI da Constituição.
Contra-arrazoado,
logrou o recurso ser admitido, por entender o Presidente daquela Corte revestirem-se
as razões recursais de 'razoabilidade', indo 'ao encontro da jurisprudência
do Col. Superior Tribunal de Justiça', da qual destacou as ementas
dos Resps 56.133-RS, relatado pelo Ministro Waldemar Zveiter e 10.021-SP,
que relatei.
Foi também
interposto pelo banco recurso extraordinário, inadmitido em decisão
que transitou em julgado".
O ilustrado
Ministro Relator, acompanhado pelo eminente Ministro Barros Monteiro, conheceu
do recurso pela apontada violação do art. 78, § 3º,
da Lei de Falências, e lhe deu provimento para o fim de determinar a
restituição das importâncias relativas a adiantamentos
em contrato de câmbio, reclamadas pelo recorrente, com preferência
até mesmo sobre os créditos trabalhistas.
02. Pedi vista
dos autos para melhor exame da matéria, tendo recebido o processo
no dia 03⁄11⁄99.
Inicialmente
devo destacar que o Senhor Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira
proferiu o seu judicioso voto com fincas, sobretudo, no seu voto-vista prolatado
no REsp 32.959-SP, da relatoria do eminente Ministro Eduardo Ribeiro, julgado
na Segunda Sessão, tendo consignado que a sua mesma conclusão,
quanto ao ponto de que ora se cuida, haveria sido consolidada pela Segunda
Sessão, quando do exame daquele recurso especial.
Contudo, ouso
observar que ali as três questões postas em desate reclamavam
definição acerca da preferência ou não dos créditos
trabalhistas sobre: a) os créditos decorrentes de trabalhos prestados
à massa falida; b) as contribuições previdenciárias
retidas pela falida; c) as custas a cujo pagamento tiver sido condenada
a massa.
Com efeito,
data venia, ali não se fez nenhum confronto, para fins de preferência,
entre os créditos trabalhistas e as restituições de
adiantamento de contrato de câmbio.
03. A precedência
das restituições de coisas arrecadadas, até mesmo com
relação aos créditos trabalhistas, repousa no argumento
de que elas cuidam de bens de terceiros, em poder do falido, ou de situações
que a lei a isso equiparou, razão pela qual sequer se cogita de concurso.
Assim, as restituições devem ser feitas antes do pagamento
de quaisquer créditos, inclusive trabalhistas, pois têm natureza
distinta desses.
Nesse sentido
decidiu a Terceira Turma, no julgamento do REsp 12.100 (Rel. em. Min. Cláudio
Santos, DJ 28⁄09⁄92), e esta Quarta Turma, no REsp 10.021⁄SP, relatado pelo
eminente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, de cujo judicioso
voto extraio os seguintes excertos:
"É certo,
e em momento algum se negou, que o crédito trabalhista goza de privilégio,
em relação aos demais créditos, preferindo inclusive
ao pagamento dos encargos e dívidas da massa.
A restituição,
contudo, não pode ser equiparada a crédito. Trata-se simplesmente
de devolução de coisas - e, em sua falta, do correspondente
em dinheiro (art. 78, § 2º) - que, embora arrecadadas em poder
do falido, não integravam seu patrimônio. Característicos
bens de terceiro."
Por isso mesmo
que "os valores devidos a título de restituição, porque
não propriamente créditos, mas dinheiro de terceiros, não
podem ser havidos como dívidas ou encargos da massa, devendo, porque
não sujeitos aos efeitos do concurso falimentar, ser pagos antes de
qualquer credor, por mais privilegiado que seja".
Para não
discrepar dessas posições, em idêntico sentido, eu mesmo
decidi no REsp 227.708–SC, julgado em 23.08.99.
Entretanto,
melhor refletindo sobre o tema, percebi, claramente, data venia, que o mesmo
lúcido raciocínio exposto no voto supra transcrito não
pode ser aplicado para os adiantamentos de contratos de câmbio.
É que
o contrato de câmbio constitui verdadeira modalidade de contrato bancário,
ao qual são submetidas obrigatoriamente as empresas exportadoras que
almejem fazer negócios no exterior.
Ao tratar do
assunto, Fernando G. M. Cavalcanti esclareceu:
"O Contrato
de Câmbio é obrigatório para o exportador, pois o Conselho
Monetário Nacional, através do Banco Central e autorizado pela
Lei 4.595, de 31⁄12⁄64 (art. 9º), traça normas rígidas
atinentes ao controle das divisas de exportação, bem como sua
obrigatória venda às instituições financeiras
autorizadas a operar com câmbio, mantendo sob fiscalização
permanente todos os contratos da espécie" (in, "Contrato de Câmbio
de Exportação em Juízo", Ed. Renovar, 1989, fl. 41⁄42).
O contrato
de câmbio para exportação revela, em verdade, nítidos
contornos financeiros, sendo classificado por Antônio Márcio
de Cunha Guimarães e Geraldo José Guimarães da Silva
entre as modalidades de operações de câmbio, como operações
financeiras, assim definidas, verbis:
"– Entende-se
por financiadas as operações para entrega ou liquidação
futura, em que o Banco paga o contravalor em moeda estrangeira ou em reais,
em todo ou em parte, ou assume o compromisso de desembolsar a moeda estrangeira
contratada, antes do recebimento da prestação a cargo do contratante
vendedor ou comprador". (in, "Manual de Direito do Comércio Internacional
– Contrato de Câmbio", Ed. Revista dos Tribunais, 1996, fl. 34).
Esclarecem,
ainda, os autores, quanto aos adiantamentos, que:
"Os bancos,
operadores de câmbio, concedem aos exportadores adiantamentos sobre
os contratos de câmbio, que consistem na antecipação parcial
ou total de cruzeiros equivalente à quantia em moeda estrangeira comprada,
a termo, pelo banco. É a antecipação do preço
da moeda estrangeira que o banco negociador das divisas concede ao exportador.
Esse adiantamento
constitui-se num incentivo à exportação, compreendido
no financiamento concedido para proporcionar ao exportador recursos para
a produção e comercialização de seus produtos,
a serem exportados. O adiantamento sobre o contrato de câmbio constitui-se
num empréstimo para capital de giro. O momento da concessão
do ACC ocorre antes do embarque da mercadoria, como financiamento à
produção e, numa segunda fase, quando a mercadoria já
está pronta e embarcada, é o financiamento à comercialização.
O valor adiantado deve ser averbado no próprio contrato de câmbio
ou através de instrumento em separado, fazendo parte integrante do
mesmo contrato." (ob. cit., fl. 153 – grifos nossos).
Irrefutável,
assim, que o adiantamento de contrato de câmbio tem natureza de financiamento
à atividade de exportação, com o empréstimo de
capital para funcionamento da empresa, em percentual sobre o valor dos produtos
a serem exportados, menos o deságio, concedido na forma de adiantamento,
para incentivar a confecção ou industrialização
dos bens (no caso, calçados) e a sua posterior comercialização.
Dessarte, a
previsão da restituição do adiantamento de contrato
de câmbio camufla, verdadeiramente, apenas mais um instrumento colocado
à disposição das instituições financeiras
para garantir o cumprimento dos empréstimos por elas fornecidos. Não
passa, na realidade, de mera garantia, mais eficiente e rigorosa, de mútuos
celebrados.
Não
se poderia admitir, de forma alguma, data venia, que uma simples restituição
de valores pagos a título de adiantamento de contrato de câmbio
para a exportação - avença essa com claros contornos
de fomento à atividade comercial - venha a se sobrepor aos créditos
trabalhistas, com descabido e exacerbado protecionismo às instituições
financeiras, em detrimento das verbas laborais dos ex-empregados do falido,
que se revestem de natureza eminentemente alimentar.
Como bem salientado
no bojo do v. acórdão hostilizado, "o crédito por restituição
'não pode estar acima dos créditos trabalhistas, estes relacionados
com a sobrevivência do ser humano ou com uma vida digna [...] A dignidade
humana e a dignidade do trabalho estão em plano valorativo superior
ao interesse de incentivo das exportações.'" (fl. 57).
Ressalto, por
derradeiro, que não se afasta o direito à restituição
das quantias adiantadas, apenas não podem as mesmas ter precedência
sobre os créditos trabalhistas.
Ante o exposto,
não conheço do recurso.
RECURSO ESPECIAL
Nº 109.396 - RS (1996⁄0061722-8)
RELATOR
: MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
RECORRENTE
: BANCO DO BRASIL S⁄A
ADVOGADO
: LEÔNIDAS CABRAL DE ALBUQUERQUE E OUTROS
RECORRIDO
: CALCADOS MORGANA LTDA - MASSA FALIDA
REPR.POR
: OSWALDO BALPARDA - SÍNDICO
4ª Turma
16.05.00
VOTO VOGAL
O MINISTRO RUY
ROSADO DE AGUIAR (PRESIDENTE):
Srs. Ministros,
também estou de acordo com o eminente Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha,
inclusive porque eu já votava assim, embora vencido nesta Quarta Turma.
O adiantamento,
como ficou visto, constitui um financiamento concedido para o exportador
garantir antecipadamente a produção da mercadoria a ser exportada.
Não se trata, portanto, de coisa em poder do financiado. Para dizer-se
que é uma coisa a ser restituída é preciso admitir tratar-se
de uma ficção. A ficção é compatível
com os princípios jurídicos, mas não pode ir ao ponto
de permitir a eliminação do direito de preferência do
crédito trabalhista na falência.
Aqui há
uma inversão de valores, isto é, em vez de se privilegiar o
crédito trabalhista, que é alimentar, privilegia-se o financiamento
bancário.
Os que conhecem
as zonas de produção de mercadorias exportáveis e que,
portanto, ficam sujeitas à variação do mercado internacional,
à variação do câmbio e à disputa de concorrência
com outros países, sabem da facilidade com que as empresas se desenvolvem
e também vão à falência em razão da mutação
desse mercado.
Quando isso
acontece, grande número de indústrias são fechadas,
empresas quebram. Se o financiamento bancário é ficticiamente
considerado como se fora um caso de restituição, a calamidade
social que daí decorre é muito grande, porque os milhares de
empregados não recebem os seus salários, os pequenos fornecedores
não recebem os seus créditos e todo o dinheiro é arrecadado,
ficando com o banco financiador.
Isso causa
realmente uma situação desastrosa, facilmente verificada em
regiões onde se produzem manufaturas exportáveis, como acontece
na região calçadista do Rio Grande do Sul, e agora também
em outros centros produtores no Ceará e na Bahia. A decisão
que o Tribunal adotou, de privilegiar sem limites, sequer temporal, os contratos
de adiantamento, traz conseqüências dramáticas do ponto
de vista econômico e social.
Estou ponderando
sobre as conseqüências da nossa decisão para concluir que
se trata de um financiamento e como tal deverá concorrer com os demais
créditos da falência. Especialmente, não há de
ser considerado em detrimento do crédito alimentar trabalhista.
Tal orientação
pode ser adotada independentemente da mudança da súmula, pois
aqui se está decidindo sobre a preferência em relação
aos outros créditos e nada impede se adote a orientação
agora preconizada pelo eminente Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.
Acompanho,
portanto, S. Exa.
CERTIDÃO
DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número
Registro: 1996⁄0061722-8 RESP 109396 ⁄ RS
Números
Origem: 343400 595183195
PAUTA: 19⁄03⁄1998
JULGADO: 16⁄05⁄2000
Relator
Exmo. Sr. Ministro
SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
Presidente
da Sessão
Exmo. Sr. Ministro
RUY ROSADO DE AGUIAR
Subprocurador-Geral
da República
Exmo. Sr. Dr.
FRANCISCO ADALBERTO DA NOBREGA
Secretário
Bel. CLARINDO
LUIZ DE SOUZA FLAUZINA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE
: BANCO DO BRASIL S⁄A
ADVOGADO
: LEÔNIDAS CABRAL DE ALBUQUERQUE E OUTROS
RECORRIDO
: CALCADOS MORGANA LTDA - MASSA FALIDA
REPR.POR
: OSWALDO BALPARDA - SÍNDICO
ASSUNTO: Comercial
- Falência - Restituição - Dinheiro
CERTIDÃO
Certifico que
a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Prosseguindo
no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha,
não conhecendo o recurso, no que foi acompanhado pelo Sr. Ministro
Ruy Rosado de Aguiar, divergindo do Sr. Ministro Relator e do Sr. Ministro
Barros Monteiro, que conheceram do recursoe lhe deram provimento, pediu VISTA
o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, nos termos regimentais.
O referido
é verdade. Dou fé.
Brasília,
16 de maio de 2000
CLARINDO LUIZ DE SOUZA FLAUZINA
Secretário
RECURSO ESPECIAL
Nº 109.396 - RS (1996⁄0061722-8)
VOTO-VISTA
O SR. MINISTRO
SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA (Relator):
1. A controvérsia,
como relatada, envolve discussão a respeito da preferência,
ou não, em processo de falência, dos pedidos de restituição
em contrato de câmbio sobre os créditos trabalhistas.
Na primeira
assentada, proferi voto pelo provimento do recurso, determinando a "restituição
das importâncias relativas a adiantamentos em contrato de câmbio,
reclamadas pelo recorrente, com preferência até mesmo sobre
os créditos trabalhistas", no que fui acompanhado pelo Ministro Barros
Monteiro.
O Ministro
Cesar Asfor Rocha, de seu turno, em voto-vista, divergiu, não conhecendo
do recurso. Entendeu S. Exa. que o contrato de câmbio, por constituir
modalidade de contrato bancário, "o qual são submetidas obrigatoriamente
as empresas exportadoras que almejam fazer negócios no exterior",
não teria preferência sobre os créditos trabalhistas.
De sua fundamentação, a propósito, colho:
"Irrefutável,
assim, que o adiantamento de contrato de câmbio tem natureza de financiamento
à atividade de exportação, com o empréstimo de
capital para financiamento da empresa, em percentual sobre o valor dos produtos
a serem exportados, menos o deságio, concedido na forma de adiantamento,
para incentivar a confecção ou industrialização
dos bens (no caso, calçados) e a sua posterior comercialização.
Destarte, a
previsão da restituição do adiantamento de contrato
de câmbio camufla, verdadeiramente, apenas mais um instrumento colocado
à disposição das instituições financeiras
para garantir o cumprimento dos empréstimos por ela fornecidos. Não
passa, na realidade, de uma mera garantia, mais eficiente e rigorosa, de
mútuos celebrados.
Não
se pode admitir, de forma alguma, data venia, que uma mera restituição
de valores pagos a título de adiantamento de contrato de câmbio
para a exportação - avença essa com claros contornos
de fomento à atividade comercial - venha a se sobrepor aos créditos
trabalhistas, com descabido e exarcebado protecionismo às instituições
financeiras, em detrimento das verbas laborais dos ex-empregados do falido,
que se revestem de natureza eminentemente alimentar.
Como bem salientado
no bojo do v. acórdão hostilizado, 'o crédito por restituição
não pode estar acima dos créditos trabalhistas, estes relacionados
com a sobrevivência do ser humano ou com uma vida digna [...] A dignidade
humana e a dignidade do trabalho estão em plano valorativo superior
ao interesse de incentivo das exportações' (fl. 57).
Ressalto, por
derradeiro, que não se afasta o direito à restituição
das quantias adiantadas, apenas não podem as mesmas ter precedência
sobre os créditos trabalhistas".
O Ministro
Ruy Rosado de Aguiar acompanhou a divergência, nestes termos:
"O adiantamento,
como ficou visto, constitui um financiamento concedido para o exportador
garantir antecipadamente a produção da mercadoria a ser exportada.
Não se trata, portanto, de coisa em poder do financiado. Para dizer-se
que é uma coisa a ser restituída é preciso admitir tratar-se
de uma ficção. A ficção é compatível
com os princípios jurídicos, mas não pode ir ao ponto
de permitir a eliminação do direito de preferência do
crédito trabalhista na falência.
Aqui há
uma inversão de valores, isto é, em vez de se privilegiar o
crédito trabalhista, que é alimentar, privilegia-se o financiamento
bancário.
Os que conhecem
as zonas de produção de mercadorias exportáveis e que,
portanto, ficam sujeitos à variação do mercado internacional,
à variação do câmbio e à disputa de concorrência
com outros países, sabem da facilidade com que as empresas se desenvolvem
e também vão à falência em razão da mutação
desse mercado.
Quando isso
acontece, grande número de indústrias são fechadas,
empresas quebram. Se o financiamento bancário é ficticiamente
considerado com se fora um caso de restituição, a calamidade
social que daí decorre é muito grande, porque os milhares de
empregados não recebem os seus salários, os pequenos fornecedores
não recebem os seus créditos e todo o dinheiro que é
arrecadado fica com o banco financiador.
Isso causa
realmente uma situação desastrosa, facilmente verificada em
regiões onde se produzem manufaturas exportáveis, como acontece
na região calçadista do Rio Grande do Sul, e agora também
em outros centros produtores no Ceará e na Bahia. A decisão
que o Tribunal adotou, de privilegiar sem limites, sequer temporal, os contratos
de adiantamento, traz conseqüências dramáticas do ponto
de vista econômico e social.
Estou ponderando
sobre as conseqüências da nossa decisão para concluir que
se trata de financiamento e como tal deverá concorrer com os demais
créditos da falência. Especialmente, não há de
ser considerado em detrimento do crédito alimentar trabalhista.
Tal orientação
pode ser adotada independentemente da mudança da súmula, pois
aqui se está decidindo sobre a preferência em relação
aos outros créditos e nada impede se adote a orientação
agora preconizada pelo eminente Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha".
Sensível
a tais considerações, e diante do fato de que a Segunda Seção
iria reexaminar o tema, resolvi pedir vista nos termos regimentais.
2. A orientação
que veio a prevalecer no âmbito da Segunda Seção, quando
do julgamento do REsp n. 316.918-RJ, ocorrido em 28.11.2001, foi idêntica
à defendida em meu voto, no sentido de que as restituições,
caso das decorrentes de adiantamento de contrato de câmbio, devem efetivar-se
antes do pagamento de qualquer crédito, ainda que trabalhista, pois
os bens a que se referem não integram o patrimônio da falida.
Em outras palavras, os créditos trabalhistas não têm
preferência, nos autos de falência, em relação
às restituições decorrentes de adiantamentos de contratos
de câmbio.
A propósito,
já com a citada orientação, confira-se o REsp n. 443.938-RS(DJ
2⁄12⁄2002), relator o Ministro Ruy Rosado de Aguiar, assim ementado:
"Falência.
Restituição. Adiantamento de contrato de câmbio. Salários.
- De acordo
com recente decisão da Seção de Direito Privado, o pedido
de restituição de adiantamento de contrato de câmbio
deve ser atendido na falência do devedor com preterição
dos créditos trabalhistas.
- Ressalva
do relator.
Recurso conhecido
e provido".
Da Terceira
Turma, de seu turno, o AgRg⁄REsp n. 330.831-RS(DJ 5⁄8⁄2002), relator o Ministro
Menezes Direito:
"Agravo regimental.
Recurso especial. Falência. Adiantamento de contrato de câmbio.
Restituição. Créditos trabalhistas.
1. As Turmas
que compõem a 2ª Seção consolidaram a orientação
no sentido de que os créditos trabalhistas não têm preferência,
nos autos de falência, em relação às restituições
decorrentes de adiantamentos de contratos de câmbio, tendo em vista
que estes constituem dinheiro de terceiro em poder do falido.
2. Agravo regimental
desprovido".
3. Nestes termos,
mantenho o voto que proferi, conhecendo e provendo o apelo especial.
CERTIDÃO
DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número
Registro: 1996⁄0061722-8 RESP 109396 ⁄ RS
Números
Origem: 343400 595183195
PAUTA: 19⁄03⁄1998
JULGADO: 15⁄04⁄2003
Relator
Exmo. Sr. Ministro
SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
Presidente
da Sessão
Exmo. Sr. Ministro
FERNANDO GONÇALVES
Subprocurador-Geral
da República
Exmo. Sr. Dr.
WASHINGTON BOLIVAR DE BRITO JUNIOR
Secretária
Bela. CLAUDIA
AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
AUTUAÇÃO
RECORRENTE
: BANCO DO BRASIL S⁄A
ADVOGADO
: LEÔNIDAS CABRAL DE ALBUQUERQUE E OUTROS
RECORRIDO
: CALCADOS MORGANA LTDA - MASSA FALIDA
REPR.POR
: OSWALDO BALPARDA - SÍNDICO
ASSUNTO: Comercial
- Falência - Restituição - Dinheiro
CERTIDÃO
Certifico que
a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Prosseguindo
no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Sálvio de
Figueiredo Teixeira, reafirmando o entendimento anterior, e o voto do Sr.
Ministro Ruy Rosado de Aguiar, retificando o voto proferido na assentada de
16 de maio de 2000, com ressalva, a Turma, por maioria, conheceu do
recurso, mas negou-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Vencido o Sr.
Ministro Cesar Asfor Rocha.
Os Srs. Ministros
Barros Monteiro, Ruy Rosado de Aguiar e Fernando Gonçalves votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente,
o Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior.
Presidiu o
julgamento o Sr. Ministro Fernando Gonçalves.
O referido
é verdade. Dou fé.
Brasília,
15 de abril de 2003
CLAUDIA AUSTREGÉSILO
DE ATHAYDE BECK
Secretária
RECURSO ESPECIAL
Nº 109.396 - RS (1996⁄0061722-8)
RELATOR
: MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
RECORRENTE
: BANCO DO BRASIL S⁄A
ADVOGADO
: LEÔNIDAS CABRAL DE ALBUQUERQUE E OUTROS
RECORRIDO
: CALCADOS MORGANA LTDA - MASSA FALIDA
REPR.POR
: OSWALDO BALPARDA - SÍNDICO
15-04-2003
4ª Turma
VOTO-MÉRITO
(RETIFICAÇÃO
DE VOTO)
O MINISTRO
RUY ROSADO DE AGUIAR:
Sr. Presidente,
recebi hoje - e essa foi a causa do atraso da sessão - uma comissão
do município de Novo Hamburgo, que veio tratar exatamente desse tema.
Naquela região, chamada de "vale do sapateiro", existem grandes empresas
calçadistas que empregam milhares de funcionários e atuam principalmente
em períodos de grande exportação. Quando se abre a exportação,
torna-se conveniente contratar. Mas depois, quando por alguma razão
muda o câmbio, tais empresas passam por dificuldades e, muitas vezes,
são levadas à falência. Nesta, os recursos da empresa
são todos canalizados para o Banco, a título de restituição.
Com isso, milhares de funcionários ficam sem receber seus salários.
Além do dano pessoal a esses empregados, há também um
reflexo na comunidade, porque eles não pagam o armazém, a escola,
o aluguel etc., impactando gravemente toda a região.
Todos sabemos
que o adiantamento em contrato de câmbio é um simples financiamento.
Logo, é caso de cobrança, não de restituição.
A conseqüência de o Tribunal aceitar essa verdadeira ficção
é o enorme dano social suportado pela comunidade. A restituição
somente pode ocorrer na hipótese de entrega de mercadoria, a qual
o credor retira dentre os bens arrecadados na falência, porque é
coisa sua. Equiparar o pagamento do empréstimo a uma restituição
de mercadoria é inadmissível, e a norma que dispõe sobre
isso deve ser interpretada dentro do sistema e atender à realidade
e à lógica.
Por isso, sempre
defendi que a restituição do que foi recebido em razão
de adiantamento para financiar a exportação não deve
ser feita em detrimento do pagamento dos salários, mas fiquei vencido
na Segunda Seção. Talvez fosse o caso até de reexaminar
a matéria; não quero, porém, postergar ainda mais a
solução do caso.
Com essa declaração,
ressalvo meu ponto de vista e acompanho o eminente Relator, conhecendo do
recurso, mas negando-lhe provimento.
CERTIDÃO
DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número
Registro: 1996⁄0061722-8 RESP 109396 ⁄ RS
Números
Origem: 343400 595183195
PAUTA: 19⁄03⁄1998
JULGADO: 20⁄05⁄2003
Relator
Exmo. Sr. Ministro
SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
Presidente
da Sessão
Exmo. Sr. Ministro
ALDIR PASSARINHO JUNIOR
Subprocurador-Geral
da República
Exmo. Sr. Dr.
FERNANDO HENRIQUE OLIVEIRA DE MACEDO
Secretária
Bela. CLAUDIA
AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
AUTUAÇÃO
RECORRENTE
: BANCO DO BRASIL S⁄A
ADVOGADO
: LEÔNIDAS CABRAL DE ALBUQUERQUE E OUTROS
RECORRIDO
: CALCADOS MORGANA LTDA - MASSA FALIDA
REPR.POR
: OSWALDO BALPARDA - SÍNDICO
ASSUNTO: Comercial
- Falência - Restituição - Dinheiro
CERTIDÃO
Certifico que
a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Retificando
a proclamação feita em 15.04.2003, prosseguindo no julgamento,
após o voto-vista do Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira,
reafirmando o entendimento anterior, e o voto do Sr. Ministro Ruy Rosado
de Aguiar, retificando o voto proferido na assentada de 16.05.2000, com ressalva,
a Turma, por maioria, conheceu do recurso e deu-lhe provimento.
Vencido o Sr.
Ministro Cesar Asfor Rocha.
Os Srs. Ministros
Barros Monteiro e Ruy Rosado de Aguiar votaram com o Sr. Ministro Relator.
O referido é verdade. Dou fé.
Brasília, 20 de maio de 2003
CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE
BECK
Secretária
Documento: 130028 Inteiro Teor do Acórdão
- DJ: 04/08/2003
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