TRIBUNAIS  SUPERIORES - JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL


RE 325550

EMENTA: Jornada extraordinária de trabalho: aplicação do divisor de 220 horas para efeito do cálculo de horas extras de empregado mensalista, que não importou ofensa, mas, ao contrário, deu correta aplicação aos dispositivos constitucionais invocados no RE (CF, art. 5º, II, 7º, XIII e XV). 

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em não conhecer do recurso extraordinário.

Brasília, 26 de fevereiro de 2002.

MOREIRA ALVES - PRESIDENTE

SEPÚLVEDA PERTENCE - RELATOR

R E L A T Ó R I O

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE - RE, a, contra acórdão do TST que negou provimento a agravo, confirmando o indeferimento de recurso de revista.

A propósito da matéria suscitada no recurso extraordinário, decidiu o TST (f. 17):

"O egrégio Regional manteve a condenação que aplicou o divisor de 220 horas para efeito de jornada extraordinária. Fundamenta-se a r. decisão no fato de que a Constituição Federal alterou o divisor de 240 para 220 horas. Afirma que a duração de trabalho prevista no inciso XIII do artigo 7º constitucional, que determinou essa redução, não importou em majoração salarial dos trabalhadores.

Concluiu o decisum que a norma constitucional teve aplicação imediata, pois independia de lei que a regulamentasse, o que afasta a argüição de ofensa a negativa de vigência aos dispositivos constitucionais e legais indicados no recurso.

Argumenta a Recorrente que foram violados os artigos 5º, II, 7º, XIII e XV da Constituição, 59, § 1º da CLT, e Lei 605 de 05/01/49.

No entanto, a alteração do divisor não importou em qualquer vulneração aos dispositivos constitucionais e celetista, pois nenhum deles veda a adoção do divisor 220."

No RE, alega a recorrente (f. 9/10):

"No mérito, a interpretação dada pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho de que a Constituição Federal (art. 7º, inciso XV) limita o período destinado ao repouso semanal remunerado do trabalhador e reduz o divisor para cálculo de horas extras, data maxima venia, não pode prosperar, sob pena de violação direta ao art. 7º, incisos XIII e XV (este por má aplicação), da Constituição Federal, realmente violados no presente caso.

Tal dispositivo constitucional apenas fixou um período mínimo destinado ao repouso semanal do operário, não limitando de forma alguma este período. Ora, caso tal entendimento fosse verdadeiro, as empresas não poderiam conceder um repouso superior a um dia em benefício do próprio obreiro. Por outro lado, o ordenamento constitucional em tela não trata de redução do divisor utilizado para o cálculo de horas extraordinárias.

Em face do exposto, requer a recorrente o conhecimento e provimento do presente recurso para, reformando a decisão impugnada, determinar a aplicação do divisor 240 para o cálculo das horas extraordinárias."

O RE foi indeferido na origem, havendo a recorrente interposto agravo a que neguei provimento pelo seguinte despacho: (f. 65): 

O requisito do prequestionamento, tanto não reclama a menção expressa ao preceito constitucional invocado no RE, como com ela não se satisfaz: exige, sempre, o exame efetivo da questão constitucional suscitada. Ora, no caso, apesar de referir-se aos incisos XIII e XV do art. 7º da Constituição, o acórdão recorrido não se pronunciou sobre os respectivos conteúdos normativos. Incidem as Súmulas 282 e 356. 

Parece evidente, em todo caso, que se a duração do trabalho normal não pode ultrapassar 44 horas semanais (CF, art. 7º, XIII), o número de horas a ser considerado para o cálculo das horas extraordinárias, no caso de empregado mensalista, será 220, e não 240 como quer a agravante. Nego provimento ao agravo.

Dessa decisão interpôs a ora recorrente agravo regimental contestando a aplicação da Súmula 282 e sustentando, verbis:

"Quanto à aplicação do inciso XIII do art. 7º em si, tem-se que ela não determina a alteração do divisor do salário mensal do empregado, de 220 para 240, para cálculo das horas extras, ao contrário do que pretendeu (e tem pretendido) a Justiça do Trabalho, data venia.

O divisor 240 era obtido considerando-se os 30 dias do mês multiplicados pelas 8 horas de trabalho diário (30 X 8 = 240), o que revela que são considerados todos os dias do mês, trabalhados ou não.

Assim, o fato de haver mais descanso (o empregado passar a trabalhar 44 horas ao invés de 48 semanais) em nada pode alterar o divisor, que sempre considera o número de dias existentes, sempre trabalhados ou não, vez que todos eles são remunerados pelo salário mensal.

Como se vê, o art. 7º, incisos XIII e XV, da Carta Magna são (e foram) mal aplicados (violados) para se determinar, como no caso de determinou, o divisor de 220, incidente sobre o valor do salário mensal do empregado, para cálculo da hora extra."

Objetivando a definição da matéria pelo STF, reconsiderei a decisão agravada e determinei a reautuação do agravo de instrumento como recurso extraordinário.

É o relatório.

V O T O

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE - (Relator): Sobre a tese sustentada no RE, o acórdão recorrido limitou-se a dizer o seguinte (f. 17):

"Argumenta a Recorrente que foram violados os artigos 5º, II, 7º, XIII e XV da Constituição, 59, § 1º da CLT, e Lei 605 de 05/-1/49.

No entanto, a alteração do divisor não importou em qualquer vulneração aos dispositivos constitucionais e celetista, pois nenhum deles veda a adoção do divisor 220."

Ainda quando, por liberalidade, se entenda essa passagem como suficiente ao prequestionamento da matéria constitucional, não há a pretendida ofensa da Lei Fundamental.

É evidente que a apuração do salário-hora, para efeito de cálculo da hora extraordinária, há de ser feita, no caso do trabalhador mensalista, mediante a divisão do salário por 220, e não por 240, como pretende a recorrente.

A afirmação de que o limite previsto no art. 7º, XIII, da Constituição "em nada pode alterar o divisor, que sempre considera o número de dias existentes, sempre trabalhados ou não, vez que todos eles são remunerados pelo salário mensal", é de óbvia improcedência. De fato, se o limite semanal é reduzido para 44 horas, a jornada média diária cai de 8 para 7 horas e 20 minutos (44 dividido por 6), o que, multiplicado pelo mês legal (30 dias), resulta no divisor utilizado (220).

Tenho, assim, como incensuráveis as seguintes considerações da decisão proferida pelo TRT (f. 40/41):

"A MM. Junta "a quo" deferiu o pleito do reclamante, sob o fundamento de que, a partir da Constituição Federal de 1988, o divisor passou de 240 para 220 horas. Disto discorda a recorrente, mediante confusa argumentação e completamente divorciada do tema examinado, "data venia". Com efeito, nada se discutiu a respeito de repouso semanal remunerado como fator de remuneração de hora extras.

Outrossim, a duração do trabalho prevista no inciso XIII do art. 7º, da Constituição, que determinou a redução do divisor mensal de 240 para 220 horas, não importou em majoração salarial dos trabalhadores. É mesmo questão de matemática, como quer a recorrente. A redução da carga horária não se discute, pois que instituída através do texto constitucional já citado. Se um trabalhador, por exemplo, percebesse salário de R$ 1.000,00 antes da Constituição, significa que o valor-hora era de R$ 4,16, considerando-se a divisão por 240. A partir de 05.10.88, o mesmo trabalhador continuou ganhando R$1.000,00, que, dividido por 220, dá R$4,54 por hora. Fazendo-se a operação inversa nos dois casos, verificar-se-á que o salário mensal não saiu majorado.

O divisor sim, foi alterado a partir de 05/10/88, mas não o salário mensal. Nisto, aliás, reside o pleito do reclamante, que, ao que parece, a reclamada não quer entender.

Ressalte-se, por último, que a norma insculpida no inciso XIII, do art. 7º da Constituição teve aplicação imediata, pois independia de lei que a regulamentasse, o que afasta a argüição de ofensa e negativa de vigência dos dispositivos constitucionais e legais indicados no recurso."

Não conheço do recurso extraordinário: é o meu voto. 

Decisão: A Turma não conheceu do recurso extraordinário. Unânime. 1ª. Turma, 26.02.2002.


Serviço de Jurisprudência e Divulgação