RE 284627
EMENTA: Adicional de insalubridade. Vinculação ao
salário mínimo. Impossibilidade, por ofensa ao art. 7o, IV,
da Constituição. Precedentes. Recurso extraordinário
conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros
do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, conhecer
do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Relatora.
Brasília,
2 de abril de 2002.
Moreira Alves - Presidente
Ellen Gracie - Relatora
R E L A T Ó
R I O
A Senhora Ministra Ellen Gracie: É esse o teor do acórdão
que julgou o agravo regimental no T.S.T:
"A Turma não conheceu do recurso de revista patronal, o
qual versava sobre a base de cálculo do adicional de insalubridade,
por óbice do Enunciado 333/TST, entendendo que durante a vigência
do Decreto-Lei n° 2.351/87 o referido adicional tem como base de cálculo
o salário mínimo a que se refere o art. 76 da CLT. Renova a
agravante a preliminar de nulidade por negativa de prestação
jurisdicional aduzindo que a Turma, mesmo provocada por meio de embargos
declaratórios, não examinou a violação do art.
5°, II, da Constituição Federal, ocorrida quando o Regional
deixou de aplicar o disposto no Decreto-Lei n° 2.351/87, que dispunha
que a base de cálculo do adicional de insalubridade deveria ser o
salário mínimo de referência, para aplicar como base
de cálculo o salário mínimo.
Como esclarecido no acórdão turmário (fls.
345) não houve ofensa ao art. 5°, II, da Constituição
Federal porque "durante a vigência do Decreto-Lei n° 2.351/87 o
adicional de insalubridade deve ser calculado tomando-se por base o piso
nacional de salários que, na época, correspondia ao salário
mínimo a que se refere o art. 76, da
CLT".
Destarte, não se encontra vulnerado o inciso LV do art.
5° da Lei Maior, porquanto foi entregue a completa prestação
jurisdicional, ainda que contrariamente ao interesse da reclamada.
Ademais, não se negou o contraditório ou o direito
de defesa a qualquer das partes, é em resposta a ele mesmo que esta
relação processual encontra-se nesta fase recursal.
Diz ainda a empresa que foi violado o art. 896 da CLT porque a
revista estava fundamentada em violação aos arts. 5°, II
e 7°, VI, da Constituição Federal e divergência jurisprudencial,
pois a agravante foi condenada a satisfazer obrigação não
prevista em lei e por ter sido utilizado o salário mínimo como
base de cálculo.
Não foi violado o art. 5°, II, da Lei Maior, porque
não se criou obrigação nenhuma que não estivesse
prevista em lei, pelo contrário, o adicional de insalubridade está
previsto na CLT - arts. 192 a 194. E o adicional referido sempre teve como
base de cálculo o salário mínimo tratado pelo Estatuto
Obreiro. A mens legis do Decreto-Lei n° 2.351/87 foi evitar que o Piso
Nacional de Salários servisse de indexador econômico.
Por tais razões, não foi aviltado o art. 4°,
I e II, do Decreto-Lei n° 2.351/87.
Também não se verifica vulneração
alguma ao art. 7°, IV, da Lei Maior, pois, como asseverado pela Excelsa
Corte, a vinculação proibida é a adoção
do salário-mínimo como unidade monetária, ou seja, visando
à adoção de fator de indexação: "Longe
fica de configurar preceito contrário à Carta o que revela
o salário-mínimo como base de incidência da percentagem
alusiva ao adicional de insalubridade. Exsurge com relevância maior
a interpretação teleológica, buscando-se o real objetivo
da Norma Maior" (AG-AI-177.959-4-MG Rel. Min. Marco Aurélio, v.g.,
DJ 23/05/97).
Destarte, os paradigmas colacionados não autorizavam o
conhecimento da revista porque superados pela atual jurisprudência
da c. SDI que já pacificou o entendimento de que "a base de cálculo
do adicional de insalubridade na vigência do Decreto-Lei nº 2.351/87
é o piso nacional de salários" . Precedentes: E-RR-29.071/91,
Ac. 0402/96,
Rel. Min. Cnéa
Moreira, DJ 22/03/96; E-RR-123.805/94, Ac.0361/96, Rel. Min. Indalécio
G. Neto, DJ 15.03.96; E-RR-55.187/92, Ac.0268/96, Rel. Min. Cnéa Moreira,
DJ 15.03.96, dentre outros (Enunciado 333/TST).
E por todo o expendido, não houve negativa de prestação
jurisdicional, restando incólume o art. 5°, LV, da Carta Magna.
Intacto o art. 896 da CLT.
Nego provimento ao agravo regimental.
É o meu voto." (fls. 380/381).
Sustenta o recorrente, preliminarmente, a nulidade do acórdão
recorrido, por negativa de prestação jurisdicional, apontando
ofensa aos artigos 5o, incisos XXXV e LV, e 93, inciso IX, da Constituição
Federal. No mérito, aduz que a decisão recorrida, ao determinar
o cálculo do adicional de insalubridade com base no Piso Nacional
de Salários durante a vigência do Decreto-Lei nº 2.351/87,
violou o disposto nos arts. 5º, II e 7o, IV da Constituição,
desenvolvendo argumentação no sentido de que a base de cálculo
do referido adicional, no período questionado, deveria ser o salário
mínimo de referência, a par da legislação vigente
e da vedação constitucional de vinculação ao
salário mínimo para qualquer fim.
Contra-razões às fls. 404/414.
Na origem, o extraordinário não foi admitido, mas,
ante o provimento do Agravo, subiram os autos a esta Corte .
O Ministério Público Federal, em parecer da lavra
do Subprocurador-Geral da República, Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos,
opinou pelo provimento do recurso.
É o relatório.
A Senhora Ministra Ellen Gracie - (Relatora): A preliminar de
nulidade do acórdão recorrido, a título de ofensa aos
arts. 5o, XXXV e LV e 93, IX, da Constituição, não procede,
pois não padece de nulidade decisão fundamentada sucintamente,
podendo o juiz acolher os argumentos que entender suficientes para fundamentar
sua decisão, não estando obrigado a acatar todos aqueles declinados
pela parte.
Quanto ao mérito, no entanto, assiste razão ao recorrente.
Esta Corte, ao julgar casos análogos, já decidiu que a utilização
do salário mínimo como base de cálculo do adicional
de insalubridade contraria o disposto no art. 7o, IV, da CF, face à
vedação constitucional de vinculação ao salário
mínimo. Neste sentido, o RE 221.234, Rel. Min. Marco Aurélio,
cujo voto condutor restou assim fundamentado:
"Os pressupostos
gerais de recorribilidade estão atendidos. O recurso extraordinário
veio subscrito por procurador do Estado, havendo sido observado o prazo em
dobro a que este último tem direito. Resta examinar a alegada violência
ao inciso IV do artigo 7º da Constituição Federal.
O alcance do preceito outro não é senão evitar
que o atrelamento do salário mínimo a situações
diversas acabem por inibir o legislador na necessária reposição
do poder aquisitivo da parcela, isto objetivando o atendimento ao que nele
previsto. Ora, na espécie, desprezando-se a existência, no período
em discussão, do salário mínimo de referência,
adotou-se, como base para cálculo do adicional de insalubridade, fator
vedado pela Carta da República.
Conheço deste extraordinário pela violência
ao inciso IV do artigo 7º da Constituição Federal e o
provejo, na forma nele proconizada, ou seja, para, reformando o acórdão
proferido pela Corte de origem, determinar que, no período de 5 de
outubro de 1988 a 3 de julho de 1989, seja observado, no cálculo do
adicional de insalubridade, o salário mínimo de referência.
É como voto."
No mesmo sentido, os RREE 236.396, rel. Min. Sepúlveda
Pertence, 234.714, Rel. Min. Moreira Alves, dentre outros.
Ante o exposto, conheço e dou provimento ao recurso extraordinário.
Decisão: A Turma conheceu do recurso extraordinário
e lhe deu provimento, nos termos do voto da Relatora. Unânime. 1ª.
Turma, 02.04.2002.
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