CLT DINÂMICA - DOUTRINA

São Paulo, 07 de dezembro de 2005.

Autor: Juiz JOÃO CARLOS DE ARAÚJO – Corregedor do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região.

LINEAMENTO DA EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL TRABALHISTA


1- A CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO E A EXECUÇÃO JUDICIAL

Ao contrário do que se pensa, a Consolidação deve ocupar lugar de destaque, no nosso ordenamento, por ser um dos seus Códigos mais modernos. Previu, já na época de sua publicação, o direito difuso nos dissídios coletivos e, ainda, serviu para modernizar o Código de Processo Civil, servindo de paradigma para vários institutos.


2-    O PROCESSO TRABALHISTA


Na fase de conhecimento, o processo trabalhista tem natureza mista: ora dispositivo, ora inquisitório. Na fase de execução, por sua vez, a sua natureza é inquisitória.


Ao contrário do que ocorre no processo civil, a execução judicial trabalhista é uma fase da reclamação, a despeito de iniciar-se com a citação do executado.


É fase porque o próprio juiz que proferiu a sentença é quem deverá, independentemente da iniciativa do exeqüente ou de qualquer interessado,  obrigatoriamente instaurá-la. Por isso é uma fase inquisitória do processo e, em assim sendo, não se admitirá, por óbvio, que o juiz executor aplique a prescrição intercorrente, pois seria o reconhecimento explícito de sua inércia.


3 – EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL


Referimo-nos, aqui, à execução de uma sentença definitiva com trânsito em julgado. Para exemplificar, vamos considerar um dissídio coletivo, no qual o sindicato profissional, há dez anos, conquistou cesta básica no embate contra o sindicato patronal. Determinada empresa ora concede, ora não, a indigitada cesta. Os seus empregados, através do sindicato, substituto processual da categoria, ingressam com uma ação de cumprimento, que é  julgada procedente em parte, e confirmada a decisão na instância superior. Com a baixa do processo se dá início à execução.


Apenas na liquidação, o juiz executor determinará que se identifiquem os seus benefíciários e se apresentem os cálculos de cada um, em determinado prazo consoante a complexidade da execução. Vale lembrar que o prazo é único, podendo ser dividido de comum acordo entre as partes (art. 879, § 1º -B  e art. 901 ambos da CLT).


Apresentados os cálculos, o juiz executor, se assim entender, determinará que, sucessivamente, se manifestem as partes, em dez dias, sobre determinado ponto que lhe parece ainda obscuro (art. 879, § 2º, da CLT). Assim procederá, em cumprimento à determinação legal, que não admite o contraditório antes do momento processual apropriado. Essa questão é de extrema relevância para a celeridade processual. No processo, assim como na partitura musical, deve existir uma seqüência harmônica. Cada ato deverá ser praticado no seu momento oportuno. A impugnação se dará naquele previsto no artigo 884 da CLT.


O exeqüente apresenta seus cálculos e, imediatamente, a executada exibirá o seu, com a indicação da quantia que entende incontroversa.


Para exemplificar, consideremos a hipótese ilustrada a seguir:


O juiz executor poderá não aceitar integralmente um dos cálculos ou ambos. Então a ilustração ficará assim:


A importância incontroversa, nos dois casos, deverá ser colocada à disposição do exeqüente em 48 horas (art. 880 da CLT). Assim, o despacho homologatório pode ser proferido nos seguintes termos: “Homologo os cálculos, fixando o valor em “R$ X,00”. Cite-se o executado para que pague, em 48 horas, a quantia incontroversa, e garanta a execução em 5 dias, pela penhora, quanto ao remanescente fixado na homologação e que excedeu a importância reconhecida pela executada. Ainda neste despacho homologatório e de citação determinará que a Previdência sobre ele se manifeste em 10 dias (art. 879, § 3º CLT).

4 – A impugnação prevista no artigo 884 e §§ da CLT.


A impugnação dos cálculos, conforme já dissemos, se dará na ação incidental constitutiva, ou desconstitutiva, como previsto no §3º do artigo citado. Essa ação incidental é dúplice, e, assim, não admite a reconvenção, pois uma parte requer contra a outra como ocorre, por exemplo, em uma ação possessória.


Se ambos requererem ao juízo, a participação da executada se dará sob o título de embargos à execução e do exequente ou da Previdência, impugnação aos cálculos.


E se os embargos à execução são uma ação, por óbvio, deverão observar o quanto se diz das condições da ação e dos pressupostos processuais objetivos e subjetivos.


Essa ação incidental quando intentada pela executada, deverá observar suas condições  específicas quanto à possibilidade jurídica do pedido. No particular, ela muito se assemelha com a ação rescisória que, também, é constitutiva ou desconstitutiva, com as hipóteses de cabimento taxativamente previstas no artigo 485, do Código de Processo Civil.


Os embargos à execução propostos pela executada se restringirão às hipóteses do § 1º, do artigo 884, da CLT, quais sejam: cumprimento da sentença ou do acordo, quitação ou prescrição da dívida. Apenas nestas hipóteses haverá julgamento de mérito para o devedor. Se ausentes, a ação será julgada extinta sem apreciação do mérito. Rejeitam-se pura e simplesmente os embargos, apreciando-se, se houver, apenas as impugnações do credor ou da Previdência.


Nesse compasso, havendo pagamento, nas 48 horas, da importância incontroversa, o juiz executor, se houver impugnação aos cálculos,  procederá ao seu exame. Não pagando a importância incontroversa, como se disse, rejeita-se, “in limine”, sem apreciação do mérito, os embargos à execução por impossibilidade jurídica do pedido.


5 – O AGRAVO DE PETIÇÃO


Paga, em 48 horas, a verba incontroversa, dar-se-á o processamento do agravo de petição, no qual a discussão se restringirá aos montantes resultantes dos cálculos dos interessados. Assim, o agravo de petição servirá a todos que se insurgirem sobre os cálculos, cada qual com o seu recurso. Mas, é bom ressaltar que, não havendo o pagamento do incontroverso, se denegará seguimento ao agravo de petição da executada, por ausência de pressuposto processual objetivo extrínseco, ou seja, o pagamento.


Os demais, o exequente e a Previdência, se descontentes com a liquidação, poderão também agravar de petição quanto aos cálculos, como se disse.


Observem a lógica do que se propôs. Se se tratasse de um recurso ordinário, na fase de conhecimento, não se determinaria seu processamento quando não fossem satisfeitas as custas e o depósito recursal. Da mesma maneira, na execução, em obediência ao princípio da integralidade dos textos legais, não se poderá determinar o processamento do agravo de petição quando os embargos à execução já foram extintos sem julgamento do mérito em razão da falta de pagamento da quantia incontroversa, o qual, frise-se, é condição da ação.


O princípio da integralidade dos textos legais impõe coerência e harmonia entre eles dentro do mesmo diploma legal. É, na verdade, a aplicação sistemática e lógica dos textos consolidados, mas dentro da fase executória do processo.


6- O AGRAVO DE INSTRUMENTO – ART. 897 ALÍNEA “B” DA CLT.


Naturalmente, o litigante de má-fé não paga, mas pretende levar avante a discussão de aspectos da decisão que liquidou os cálculos. Descontente, assim, com a denegação do processamento do agravo de petição , agravará, por certo, de instrumento. Esse terá que ser processado, mas o art. 897 da CLT, remete, nesse ínterim, as partes para prosseguimento da execução quanto ao incontroverso e a diferença autorizada pelo juiz executor na liquidação. Destarte, quando for negado provimento ao agravo de instrumento, o que é usual, a execução já estará bastante avançada. Em alguns casos, até com praça realizada, sem que seu auto esteja assinado pelo juiz executor, para que não se possa dá-la por perfeita e acabada. E, com a baixa do agravo de instrumento, o juiz executor atento não determinará, de plano, a atualização dos cálculos, para que assim não se crie a possibilidade de rediscutir a execução antes que o exeqüente receba aquilo que já se encontra acertado judicialmente. Pago o estabelecido, só então determinar-se-á a atualização dos cálculos, se for o caso.


7 – A PRESCRIÇÃO NA AÇÃO DE CUMPRIMENTO


A prescrição é matéria de mérito e deve ser alegada na fase de conhecimento da ação. Há, contudo, aquela que, como matéria de mérito, na ação incidental, deverá ser alegada como defesa do executado, na forma do § 1º do art. 884, da CLT. Uma não se confunde com a outra. É que na ação de cumprimento, o sindicato profissional substitui a categoria e, como tal, promove esta ação sem que haja necessidade de se nomear os beneficiários. Vai daí que, na liquidação, ao serem apresentadas as contas, certos substituídos poderão ter parte de seu crédito prescrito. Essa prescrição será alegada na fase de embargos à execução. É a hipótese que descrevi, no item 3, quanto à cesta básica.


8- A SÚMULA N.º 01, DO C. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO
“EXECUÇÃO TRABALHISTA DEFINITIVA. CUMPRIMENTO DA DECISÃO. (RA n.º 06/2002 - DJE 28/06/2002)
O cumprimento da decisão se dará com o pagamento do valor incontroverso em 48 horas, restando assim pendente apenas o controvertido saldo remanescente, que deverá ser garantido com a penhora.”

Essa súmula, pela sua relevância, foi alçada à categoria de Provimento, qual seja, Provimento GP/CR n.º 05/2005, de 05 de abril de 2005, cuja ementa enuncia:

“Execução definitiva. Liberação da parte incontroversa ao credor em quarenta e oito horas. Observância da Súmula nº 1 deste Regional, com o espírito dos artigos 880 e 884, § 1º, da CLT.”


Como tal, sua aplicação é obrigatória. Mesmo que assim não fosse, o certo é que o princípio da utilidade dos atos jurídicos tem aplicação plena na questão da verba incontroversa e sua liberação. Não é plausível que o legislador pátrio crie a figura em comento sem que haja uma utilidade prática . Se o executado está obrigado a demonstrar a quantia incontroversa, e o faz, por óbvio, não será para que tramitem, a controversa e a incontroversa, da mesma maneira, numa procrastinação que chega às raias da litigância de má-fé.


9- EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA COM EXPEDIÇÃO DE PRECATÓRIO


Cientes do  interesse público envolvido nas execuções contra a Fazenda Pública que demandam a expedição de precatórios e diante do disposto no art. 1º-E, da Lei N.º 9494/97, a Presidência e a Corregedoria do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região baixaram dois provimentos para regulamentar o seu processamento, a par das determinações contidas na Portaria GP n.º 41/2004, que também regulamenta a tramitação de precatórios.


A preocupação basilar da Administração, que motivou a elaboração do Provimento GP/CR n.º 10/2005, foi imprimir celeridade ao trâmite dos processos que demandam a expedição de precatórios e, sobretudo, precisão aos respectivos pagamentos.

Através do citado provimento, foi introduzida, na fase de liquidação, após a primeira manifestação das partes sobre os cálculos periciais, a intervenção da Assessoria Sócio-Econômica do Regional, com emissão de parecer (art. 2º), antes da homologação pelo Juízo Executor, o qual terá, assim, mais elementos para decidir.

Nos processos, cuja sentença de liquidação foi proferida, sem a aludida providência, na hipótese de interposição de Agravo de Petição, a Assessoria Sócio-Econômica emitirá parecer antes da sua distribuição para uma das Turmas do Tribunal (art. 3º).


O Provimento GP/CR n.º 20/2005, por sua vez, ao determinar nova intervenção da Assessoria Sócio-Econômica, para conferência tanto do valor do precatório quanto da metodologia utilizada para sua aferição, antes do seu pagamento ao credor, objetiva imprimir-lhe exatidão, para impedir que um erro de cálculo impercebido durante a sua tramitação possa reverter em proveito indevido ao credor em detrimento do erário e, por via reflexa, de toda a sociedade.


10- CONCLUSÃO


Podemos afirmar, sem sombra de dúvida, que a Consolidação das Leis do Trabalho foi pioneira e serviu de fonte para outros diplomas legais se abeberarem. O seu vanguardismo não deve inspirar apenas o legislador, mas, sobretudo, o operador do direito, através do qual a entrega da prestação jurisdicional se perfaz.


A natureza do crédito trabalhista clama pela celeridade e, acima de tudo, efetividade. No entanto, ao observarmos a realidade, constatamos que esse clamor não é atendido a contento. Isto porque, como popularmente costuma se dizer “o reclamante ganha, mas não leva”. Essa expressão espelha, infelizmente, o que ocorre, com freqüência,  no processo trabalhista. A obtenção do título judicial, na fase de conhecimento, é apenas uma etapa de uma jornada cheia de percalços, notadamente na fase de execução, justamente na qual se dá a efetiva entrega do seu crédito trabalhista.


Assim, o acompanhamento e direcionamento dessa fase pelo Magistrado, diretor do processo, são fundamentais, para que a execução se ultime de maneira célere.


Vale lembrar, por fim, que o título extrajudicial, atendidas as adaptações necessárias, será executado nas mesmas considerações, consoante se deduz do art. 877-A, da CLT.

Serviço de Jurisprudência e Divulgação