CLT DINÂMICA - DOUTRINA
DA AÇÃO E SUAS
CONDIÇÕES
Carlos Alberto Frigieri
Juiz do
Trabalho
O homem
é um ser essencialmente societário, em virtude não só
de seu instinto, mas de suas limitações físicas,
e, também, porque, por sua inteligência, verificou ser
a vida em sociedade o modo essencial para o seu desenvolvimento, progresso
e alcance de seus objetivos.
Individualmente, o homem possui necessidades físicas (comer, beber,
dormir, eliminar detritos), sem as quais não vive, que são limitadas.
Possui, também, necessidades psicológicas (sem as quais pode
sobreviver), hoje exacerbadas por interesses econômicos (o consumismo),
que só são satisfeitas pelos bens materiais, que, por sua vez,
são limitados.
Quando alguém se situa numa posição de desejo em relação
a algo, surge o “interesse” (posição favorável à
satisfação de uma necessidade) e, quando tal interesse for amparado
por lei, surge o direito.
Quando mais de uma pessoa manifesta seu interesse em relação
a um bem, surge o conflito de interesses.
A necessidade psicológica, gerada pela ambição e avareza,
bem como a necessidade de viver em sociedade (conviver e coexistir), estabelecendo
entre si, "... relações de coordenação, subordinação,
integração e delimitação..." (MARIA HELENA DINIZ
- in Compêndio de Introdução à Ciência do
Direito) ou de outra natureza, exercendo e sofrendo influências,
obrigou o homem a criar as normas de direito, para, estabelecendo condições
de equilíbrio, evitar a desagregação do grupo, e, conseqüentemente
o desaparecimento do ser humano.
Dessa forma, constata-se que não há sociedade sem direito
(ubi societas ibi jus).
Após a superação de uma fase primitiva de autotutela,
onde os fortes impunham sua vontade unilateral aos mais fracos, nasceu aos
poucos a tendência e a necessidade do Estado, que se fortalecia e se
afirmava, ditar a solução para os dissídios individuais
vedando o exercício da justiça pelas próprias mãos,
uma vez que esta não refletia a verdadeira expressão de "justiça",
surgindo, assim a jurisdição.
No entanto, essa jurisdição necessariamente estática,
visando a não abalar a pacificação dos conflitos e a
não comprometer a imparcialidade da distribuição da justiça,
deveria ser provocada pela parte que se sentisse lesada, surgindo, assim,
a ação (direito à provocação da atividade
jurisdicional, independentemente do resultado).
A ação é substitutivo público da vingança
privada, com qualquer do povo podendo exercitá-la.
É instituto de Direito Processual e, como tal, representa “meio”
(e não fim) para garantir o direito material e sob essa perspectiva
deve ser considerado.
É por meio do direito de ação que se atinge a sanção.
Alguns autores afirmam que deve ser considerada sob duas óticas.
A primeira pré-processual, como direito de provocar a atividade jurisdicional
(inafastabilidade), sendo este direito incondicionado e abstrato.
A segunda concepção é a material, sendo sinônimo
de direito material em exercício.
O conceito processual da ação chama-se demanda, que é
ato de ir a juízo, provocando a atividade jurisdicional.
Não se confunde com o sentido pré-processual eis que neste
há um direito abstrato disponibilizado e no conceito processual há
um direito concreto (ação exercida).
Em toda demanda há pelo menos uma relação jurídica,
que são: sujeitos (partes), objeto (pedido) e fato (causa de
pedir).
Estes, pois os elementos da ação:
1- Partes processuais – que estão no processo agindo
com parcialidade. Não se confunde com parte do litígio, que
é extraprocessual, com sentido material, podendo não corresponder
ao sentido processual. Será ilegítima a parte que não
está autorizado a conduzir o processo;
2- Causa de pedir – é a soma do fato jurídico
e da relação jurídica (fato + direito subjetivo que afirma
ter). É o direito que decorre de um fato. Pela teoria da substacialização
ou da substanciação, a causa de pedir deve ser completa, com
o fato jurídico (remoto) e a relação jurídica
(próximo) - art.
282, III, CPC. Para a teoria da individualização basta
a simples afirmação do direito (relação jurídica),
sem o fato que o gerou;
3- Pedido – prestação jurisdicional que
se deseja.
Segundo Liebmam (teoria eclética) a ação é um
direito preexistente ao processo e é dirigida em face do Estado.
Destarte, juntamente com a "jurisdição" e o "processo", a
ação completa a trilogia de estrutura da ciência processual.
Seu estudo não dispensa uma análise histórica e sua
conceituação correta é essencial, visando a evitar conseqüências
danosas que se reflitam em pontos de importâncias, como as condições
da ação e a coisa julgada.
Surgiram teorias a respeito da natureza da ação, que evoluíram
até os dias atuais.
Tais teorias são, em síntese: a) a teoria unitária
– do direito material-processual; b) teoria do binômio – processo e
mérito, estando a ação incluída neste último;
c) teoria do trinômio – processo, ação e mérito.
No início, o conceito de ação não conseguia
se desvincular do direito material, em função da dominante
posição romana, cuja teoria, denominada imanentista (ou teoria
unitária do direito material processual), formulada por um jurista
chamado CELSO, definia a ação como "o direito de pedir em juízo
o que nos é devido". Assim a ação representava uma reação
do próprio direito. Esta posição imanentista permaneceu
até meados do século XIX, tendo, como um de seus adeptos o ilustre
SAVIGNY.
O judiciário legisla norma individual para cada caso concreto, participando
o processo da criação do direito. Na verdade, a solução
já existia na lei, tendo surgido o conflito levado ao judiciário,
daí ser inaplicável tal teoria.
O ordenamento jurídico que é uno e indissociável, admite
a distinção de 2 planos: a) material - conjunto de princípios
que atribuem leis de vida a pessoas, disciplinam condutas e organizam a convivência
social; b) processual – conjunto de atividades e poderes que, em cooperação,
impulsionam a atividade jurisdicional. Mesmo nas sentenças dispositivas
(aquelas que estabelecem uma regra), o juiz extrai a decisão do sistema.
Há, nesse caso, lacuna intencional mas não de valor (axiológica).
Partindo da célebre polêmica na Alemanha entre WINDSCHEID e
MUTHER sobre a actio romana, um jurista de nome ADOLPHO WACH, em 1888 escreveu
uma monografia denominada "Ação Declaratória", distinguindo
o direito lesado da ação como direito autônomo, observando
que, na ação declaratória pode-se pretender não
somente a declaração da existência de uma relação
jurídica, mas também de sua inexistência (ação
declaratória negativa).
Quem tem ação tem direito a uma pretensão jurídica,
ou seja, poder de acionar o Estado, pedindo-lhe um pronunciamento.
De tal teoria, surgiram outras. Uma delas desenvolvida por renomados juristas,
entre eles GIUSEPPE CHIOVENDA, afirma que o direito de ação,
autônomo, desvinculado completamente da matéria pertinente ao
bem que se pretende com a prestação jurisdicional, só
pertence àquele a quem, na ordem jurídica, socorre a razão.
Sem ter razão, não existe ação, ficando conhecida
como a 'teoria concretista da ação', porque, apesar de reconhecer
tratar-se de um direito autônomo, vinculava sua existência à
procedência do pedido do autor.
No entanto tal teoria não prevaleceu por ser contraditória
e insuficiente para explicar a natureza das ações julgadas improcedentes.
Outra teoria foi criada na Alemanha em 1877 por DEGENKOLB, que concebia
a ação como um 'direito autônomo e abstrato de agir',
não vinculando o direito de ação à existência
efetiva do direito material invocado (direito abstratíssimo de agir).
Verificou-se, como observa ERNANI FIDELIS DOS SANTOS, in Introdução
ao Direito Processual Civil Brasileiro, primeira edição, página
55 "que o direito de ação visa à obtenção
de um julgamento, que, negando ou não o pedido, tem existência
e que o sujeito passivo do direito de ação não é
o réu, mas o Estado que é quem presta tutela jurisdicional.
Em conseqüência, seu objetivo não pode ser uma sentença
favorável, mas uma sentença de mérito”, que pode não
ser alcançada, sem que tenha havido ação.
Não deixa de haver ação quando uma sentença
injusta nega o direito ou quando concede a quem não tem o direito.
Basta ao autor fazer referência a um interesse seu protegido em abstrato
pelo direito. A ação existe mesmo que não exista direito
material.
A ação, portanto, é um direito público (dirigida
contra o Estado e porque nasce em decorrência da supressão
da violência privada, que dá lugar ao império do direito
da paz e da justiça, obtidas através do monopólio jurisdicional,
posto em marcha através da ação, havendo, assim, um interesse
público), subjetivo (decorrente da personalidade, deferido a todos
indistintamente), pois consiste no poder de cada um de invocar a função
jurisdicional (exceto nos casos da ação coletiva, cujos titulares
são entes coletivos), autônomo (ou incondicionado) independendo
da existência de direito material, abstrato já que pede provimento
jurisdicional de qualquer natureza (favorável ou desfavorável,
justo ou injusto) e instrumental não existindo para satisfazer a si
mesma, indeterminada, inexaurível e inconsumível, sendo irrelevante
que o autor tenha ou não razão (ex.: aquele que aciona mas
não tem o direito material, recebe o pronunciamento favorável
em função da revelia do réu).
Em síntese, o direito público, autônomo, abstrato incondicionado,
constitucionalmente assegurado à pessoa, natural ou jurídica
e a alguns entes coletivos, para invocar a prestação jurisdicional
do Estado.
A valorização de possuir ou não o direito é
exclusiva do autor, que inclusive assume o risco de escolher quem deve ser
o réu.
Celso Agrícola Barbi critica a teoria abstratista, afirmando que,
por ela, a ação não é um direito mas mera faculdade
e que nem todo pedido à autoridade judiciária constitui uma
ação, daí, para ele, ser duvidoso afirmar que uma ação
exista independentemente de o autor ter o direito material invocado e pertença
a todas as pessoas, pois seria um direito dos que eventualmente não
têm direito.
A crítica, “data venia”, não é justa.
A ação é um direito porque assegurada constitucionalmente
e de todos, independentemente do direito material existir, caso contrário,
a ação julgada improcedente e a declaratória negativa
seriam inexplicáveis.
Quanto ao fato de os pedidos formulados à autoridade judiciária
serem sempre ou não ação, passa pela circunstância
de se saber se a jurisdição voluntária, é, de
fato, jurisdição.
A ação e o processo funcionam desde a demanda até a
sentença sem que se saiba quem tem razão. Logo, a ação
vem e atua prescindindo da efetiva existência do direito demandado.
A pretensão não é a ação. A ação
é o poder jurídico de fazer valer a pretensão, que é
a auto-atribuição de um direito, podendo aquela existir mesmo
quando este for infundado.
A ação é o poder jurídico de impulsionar a jurisdição
e o direito de demandar é o concreto exercício do direito de
ação.
A reelaborada teoria do direito abstrato de agir ou da asserção
(ou da afirmação) dispõe que “o Estado, monopolizando
a tutela jurídica processual, deu ao particular, em contrapartida,
o poder de se fazer ouvir sempre, quer tenha ou não razão, para
receber uma resposta. O direito de ação é instrumental
e viabilizará ou admitirá o pronunciamento com base apenas na
afirmativa abstrata do autor na inicial. As condições da ação
são, na verdade, condições para que o juiz julgue o
mérito, impostas, basicamente, por razões de economia processual
e não condição para a existência da ação,
que é incondicionada. O exame de tais condições deve
ser feito com abstração e com base nas afirmativas do
autor na inicial, o que não significa presunção de veracidade
de tais alegações, sem qualquer comprometimento com o mérito.
O exercício do direito de ação traz em si o risco do
provimento jurisdicional.
Assim, a decisão sobre as condições da ação
não precluem para o Juiz, já que tratam de questão de
ordem pública, podendo ser analisadas a qualquer momento.
Dessa forma, surge no processo três ordens de matéria a serem
observadas: matéria referente ao processo, matéria referente
à ação e matéria referente ao mérito.
Sendo o direito de ação instrumental, necessário para
fazer atuar toda a ordem jurídica, é mister que seu exercício
esteja condicionado ao preenchimento de alguns requisitos, chamados condições
da ação.
Para as teorias imanentista e concretista a distinção entre
carência de ação e improcedência não faz
sentido, pois, enquanto, para a primeira, a ação é o
próprio direito em defesa, para a outra é o direito processual
de quem tem o direito material, gerando conseqüências danosas na
apuração dos limites da coisa julgada (material).
Condições da ação, segundo ARRUDA ALVIM, citado
por HUMBERTO THEODORO JÚNIOR in Curso de Direito Processual Civil,
volume I, 6ª edição, página 54 "são as categorias
lógico-jurídicas, existentes na doutrina, e muitas vezes na
lei (como é claramente o caso do direito vigente), mediante as quais
se admite que alguém chegue à obtenção da sentença
final", ou seja, para se alcançar uma decisão de mérito
que componha efetivamente o litígio, uma vez que o simples pedido é
insuficiente, porque o exercício do direito de ação requer
um processo composto de uma sucessão de atos visando atingir um fim
(a sentença).
Verificando-se, desde logo, a impropriedade do seu exercício, antes
da sentença, deve ser eliminado para evitar o dispêndio inútil
de atividade jurisdicional e dificultar a distribuição de justiça.
As condições da ação estão colocadas
entre os pressupostos processuais e o mérito e, entre nós,
estão enumeradas taxativamente pelo artigo
267, VI do Código de Processo Civil.
São condições do exercício do direito de ação:
possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir, legitimidade.
Na verdade, o nome mais adequado seria “condições para
análise do mérito da ação”, eis que haverá
exercício do direito de ação do autor, mesmo que seja
infundada a pretensão (improcedência) ou mesmo que estejam ausentes
a legitimidade de parte, o interesse de agir e a possibilidade jurídica
do pedido, impedindo o Estado de compor a lide (extinção do
processo sem o julgamento do mérito), isto porque basta que haja um
“pedido de tutela jurisdicional”, independentemente do resultado.
POSSIBILIDADE JURÍDICA
DO PEDIDO
É uma questão controvertida no campo doutrinário.
ERNANI FIDELIS DOS SANTOS na obra já citada, página 158,
assim se manifesta:
"Por se tratar da existência mesma de um direito, com fundamento na
lei, parte da doutrina tem entendido que a possibilidade jurídica do
pedido é mérito e não condição da ação.
A propósito aliás, o próprio LIEBMAN retrocedeu e deixou
de considerar a possibilidade jurídica como condição
da ação, na mais recente edição de seu Manuale.
... De qualquer modo, porém, a lei brasileira, em que pese o retorno
de seu inspirador, mantém a possibilidade jurídica como condição
da ação. E a nós nos parece, dentro do informativo do
Código, que a posição está correta, pois, se o
mérito se identifica com o próprio pedido do autor, este não
é examinado se ocorre vedação legal para aquilo que
o pedido revela. A decisão sobre o pedido tem por tendência natural
a definitividade. No caso de possibilidade jurídica, a lei poderá
se alterar, como, por exemplo, já sucedeu no caso do divórcio.
E, aqui, não se pode dizer que houve alteração na ordem
fática da pretensão, pois o que mudou foi simplesmente a lei.
A pretensão continua com o mesmo fundamento".
Verifica-se assim que a possibilidade jurídica do pedido sob o aspecto
negativo, equivale à inexistência de vedação (não
condicionada à tipicidade da figura legal prévia) contra a formulação
de um pedido, pois a falta de previsão constitui lacuna que deve ser
suprida pelo juiz (artigo
126 Código de Processo Civil - indeclinabilidade) pelos métodos
de integração da norma (artigos 4º e 5º da Lei de
Introdução ao Código Civil - Analogia, Costumes, Princípios
Gerais do Direito). Sob o aspecto positivo, para os que o defendem, significa
a necessidade que o ordenamento permita, em abstrato, o provimento desejado,
como, por exemplo: o adicional de penosidade, o aviso prévio proporcional.
Não obstante, ensina HUMBERTO THEODORO JÚNIOR na obra já
citada, página 57:
"a possibilidade jurídica do pedido deve estar localizada no pedido
imediato (aquele formulado contra o Estado) e que consiste na permissão,
ou não, do direito positivo a que se instaure a relação
processual em torno da pretensão do autor...", em oposição
ao pedido mediato formulado contra o réu e que se refere à providência
de direito material (mérito).
E continua o ilustre professor: "Essa distinção entre possibilidade
jurídica do pedido imediato e a do pedido mediato foi, aliás
expressamente agasalhada pelo Código no artigo 295, parágrafo
único".
Com efeito, o inciso II do referido dispositivo considera inepta a petição
inicial quando "da narração dos fatos não decorrer logicamente
a conclusão" (impossibilidade de direito material, ou do pedido mediato)".
Neste caso, o indeferimento importará apreciação do
mérito da causa, fazendo, desde logo, coisa julgada material e impedindo
a renovação da ação.
"Equivale a verdadeira declaração de improcedência do
pedido", diz THEODORO. E continua: "Já o inciso III do mesmo parágrafo
(artigo 295) declara também a inépcia da inicial quando o pedido
for juridicamente impossível (impossibilidade do direito instrumental,
ou do pedido imediato)".
Nesta hipótese "... é que teremos a apreciação
de uma verdadeira condição da ação, pois o que
o juiz vai decidir é que o pedido de tutela jurisdicional é
insuscetível de apreciação pelo Poder Judiciário,
sem cogitar da sua procedência ou improcedência diante das regras
substanciais da ordem jurídica. Não ocorrerá, por isso
mesmo, coisa julgada material e não estará a parte impedida
de voltar a propor a ação, depois de preenchido o requisito
que lhe faltou na primeira oportunidade".
Isto significa dizer que, se no futuro houver regulamentação
possibilitando o exercício do direito processual, não haverá
o empecilho da coisa julgada a obstar à pretensão de direito
material pretendida pelo autor. É o caso, por exemplo, da Lei nº
883 de 21.10.49, hoje revogada pela Constituição da República
Federativa do Brasil (artigo 227, parágrafo 6º), em que era vedado
a ação de investigação de paternidade adulterina
na constância do casamento do genitor adúltero. Uma decisão
num pedido desta natureza antes da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988, reclamava como decisão a 'extinção
do processo sem o julgamento do mérito', que não transitasse
em julgado materialmente, sem tornar inalterável a situação
das partes.
Alguns autores afirmam que a possibilidade jurídica do pedido deve
ser visualizada sob o aspecto negativo tanto no processo civil como no processo
do trabalho e sob o aspecto positivo no processo penal e tributário,
afirmativa que sucumbe aos argumentos relativos à teoria da asserção.
Parece-nos, porém, que a possibilidade jurídica do pedido
não consegue se distinguir do mérito, pois analisar se o pedido
(incluindo-se a causa de pedir) pode, mesmo em tese, ser apreciado, é
analisar o próprio mérito.
INTERESSE DE AGIR
É o segundo elemento das condições da ação,
e consiste, conforme ANTONIO CARLOS DE ARAÚJO CINTRA, ADA PELLEGRINI
GRINOVER e CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO em "Teoria Geral do Processo", 2ª
edição, páginas 222 e 223, na utilidade, necessidade
e adequação (correta escolha do provimento e do procedimento)
de se movimentar o judiciário (129
Código de Processo Civil). Utilidade por pretender-se extrair um resultado
útil, não se prestando o processo como instrumento de meras
indagações ou consultas acadêmicas; necessário
porque só pela tutela jurisdicional é possível à
satisfação ou à proteção de um direito
lesado, já que o Estado veda autotutela; adequação é
a aptidão do provimento jurisdicional solicitado para o resgate da
lesão sofrida; por exemplo, quem alega adultério não
pode pretender a anulação do casamento, mas só a separação
judicial.
Na verdade, tudo o que é necessário é útil,
mas nem tudo que é útil é necessário.
O interesse é subjetivo e identifica-se com o caráter abstrato
e incondicionado de agir, porque, como vimos pela teoria da ação
como direito autônomo e abstrato, o direito de ação é
distinto do direito material a que visa a tutelar e o interesse é algo
pessoal variável de pessoa para pessoa: um pretende a declaração
judicial de existência ou inexistência de uma relação
jurídica, outro por motivo de ordem moral, etc.
LEGITIMIDADE DE PARTE
Partes, no processo, são os sujeitos interessados no contraditório
instaurado e todos os sujeitos da relação processual
Constitui o terceiro elemento das condições da ação.
É a correspondência entre a pessoa qualificada no processo
com aquela efetivamente chamada para integrar a relação jurídica,
independentemente de ser ou não titular do direito material discutido,
o que consistirá análise de mérito (eu, e não
terceiros, defendo os direitos que afirmo ter).
O problema da legitimação consiste em individualizar a pessoa
a quem pertence o direito de agir (pertinência objetiva).
Para verificar se os chamados a juízo são efetivamente os
titulares dos direitos controvertidos, o juiz deverá necessariamente
analisar a relação jurídica material (mérito),
não podendo haver uma antecipação na verificação
das condições da ação.
Legítima para o processo é a pessoa do conflito, embora possa
não ser o titular do direito discutido, pois as condições
da ação não se prestam a tal análise, mas é
a pessoa identificada no processo, aquela que se diz titular do direito e
aquela contra a qual se pretende a satisfação.
Se não tiver relação com o bem em litígio, a
ação será julgada 'improcedente', porque aí se
estará analisando o mérito.
"Visa apenas aos casos de homonímia", também na esteira da
ação como um direito abstrato, autônomo e incondicionado
de agir. Isso porque da mesma forma que não deixa de haver ação,
quando uma sentença justa nega o direito invocado pelo autor, também
não deixa de existir quando a sentença conceda o direito a quem
não o tenha realmente, significando que o direito de ação
não depende da existência efetiva do direito invocado.
Assim é que o substituto processual não tem o direito material
deduzido, mas assevera que o substituído os possui, sendo aquele parte
processual legitimada para propor a ação, quando autorizado
por lei.
HUMBERTO THEODORO JÚNIOR (obra já citada, páginas 60/61),
critica a posição de ARRUDA ALVIM que entende que "estará
legitimado o autor quando for o 'possível' titular do direito pretendido,
ao passo que a legitimidade do réu decorre do fato de ser ele a pessoa
indicada, em sendo procedente a ação, a suportar os efeitos
oriundos da sentença". Escreve THEODORO: "a lição, data
maxima venia impregna-se excessivamente do conteúdo da relação
jurídica material deduzida em juízo (mérito), e não
condiz bem com a idéia de direito autônomo e abstrato que caracteriza,
modernamente, a ação como o direito à composição
definitiva da lide. Se a lide tem existência própria e é
uma situação que justifica o processo, ainda que injurídica
seja a pretensão do contendor, e que pode existir em situações
que visam mesmo a negar “in totum” a existência de qualquer relação
jurídica material, é melhor caracterizar a legitimação
para o processo com base nos elementos da lide do que nos do direito debatido
em juízo, porque mesmo sendo injusto, pode haver procedência.
Destarte, legitimados ao processo são os sujeitos da lide, isto é
os titulares dos interesses em conflito. A legitimação ativa
caberá ao titular do interesse afirmado na pretensão, e a passiva
ao titular do interesse que se opõe ou resiste à pretensão".
Alguém, desde que citado, passa a ser réu, mesmo que seja
para alegar a inexistência de relação jurídico
material com o autor, tendo, nesse caso, interesse em pedir a improcedência
do pedido.
Tanto é assim que Moacyr Amaral Santos leciona “in” Primeiras Linhas
de Direito Processual Civil, vol 1º, p. 346: “Partes, no sentido processual,
são as pessoas que pedem ou em relação às quais
se pede a tutela jurisdicional. Podem ser, e geralmente o são, sujeitos
da relação jurídica substancial deduzida, mas esta circunstância
não as caracteriza, porquanto nem sempre são sujeitos dessa
relação.
São, de um lado, as pessoas que pedem a tutela jurisdicional isto
é, formulam uma pretensão e pedem ao órgão jurisdicional
a atuação da lei à espécie. Temos, aí,
a figura do autor...” “... de outro lado, são partes as pessoas contra
as quais, ou em relação às quais, se pede a tutela jurisdicional:
sentença condenatória, providência executiva...” etc.
A disposição do art.
3º do CPC, segundo Miguel Reale, representa uma hipótese
de interesse legítimo, sem que haja direito subjetivo, afirmando que
“Pode o juiz, a final, concluir pela inexistência do direito subjetivo
pretendido pelo autor, mas não pode desde logo repelir a ação,
se do complexo das razões de fato e de direito expostas na inicial
resultar a existência de um interesse legítimo, como tal entendido
uma pretensão razoável cuja procedência ou não
só pode resultar do desenvolvimento do processo”.
A Legitimação coletiva tem natureza jurídica controvertida,
entendendo a doutrina que: a) é ordinária (associação
estaria defendendo seus próprios interesses institucionais); b) extraordinária
(é dado poder a alguém para defender interesses alheios – da
comunidade); c) sui generis – terceiro gênero (legitimação
autônoma para condução do processo.
A legitimação coletiva, sendo atribuição da
lei (“ope legis”), pode ser controlada pelo juiz (“ope judicis”)?
Nelson Nery diz que não, pois foi o legislador que estabeleceu o
rol.
No entanto, prevalece, no Brasil, a possibilidade de controle pelo juiz,
pois não é porque há legitimação coletiva
que se pode propor qualquer ação coletiva (pertinência
temática - STF – deve dizer respeito da atuação da entidade
autorizada que está propondo a ação), sendo autorizado
o controle pelo art. 82, parágrafo 1º, CDC.
A legitimação coletiva passiva é admitida no Brasil?
Poderia-se demandar contra uma coletividade?
É admissível, como no caso de a União ingressar com
uma ação em face da Federação Nacional dos Policiais
Federais, para forçar o término de greve. Nesse caso a Federação
não está defendendo interesse próprio. Outra hipótese
é a do réu que quer propor rescisória em face da entidade
coletiva que lhe propôs ACP.
EM RESUMO:
Sendo a ação um direito público, subjetivo, autônomo
ou incondicionado e abstrato, as condições da ação
devem analisadas “in abstrato”, mesmo porque tal não se confunde com
o o resultado com o resultado da prestação jurisdicional
1 - Possibilidade jurídica do pedido é a inexistência
de vedação contra a formulação de um pedido (126
Código de Processo Civil), pois a falta de previsão constitui
lacuna que deve ser suprida pelo juiz (indeclinabilidade) através da
Analogia, Princípios Gerais do Direito, costumes, etc. (métodos
de integração da norma) ou julgar improcedente o pedido;
2 - Interesse de agir: necessidade e utilidade de se movimentar o judiciário
(129
Código de Processo Civil) por haver alguma resistência ao direito.
É subjetivo e identifica-se com o caráter abstrato e incondicionado
de agir;
3 - Legitimidade de parte é a pessoa do conflito, embora possa não
ser o titular do direito discutido, mas é a pessoa identificada no
processo, contra a qual se formula uma pretensão. Se alguma das partes
não tiver relação com o bem em litígio, a ação
será julgada improcedente (ex.: se o autor disse que trabalhou como
empregado para o réu, só este tem legitimidade para responder
a ação).
Conclui-se
assim , que as condições da ação "são requisitos
de ordem processual, intrinsecamente instrumentais e existem, em última
análise, para se verificar se admissível ou possível
a análise do mérito. Não encerram, em si, fim algum;
são requisitos-meio para ser julgado o mérito", uma vez que
o processo não regula o conflito, mas apenas o modo de defendê-lo.
Talvez como ranço dos Códigos anteriores que não estabeleciam
critérios corretos de diferença entre carência e improcedência
da ação e a isto não se dava importância, abusou-se,
e ainda hoje se abusa, do termo o que constitui fator de grande prejuízo
aos jurisdicionados.
O exercício do direito de ação não pressupõe
que aquele que o meneje venha a ganhar a causa ou que quem ganhe a causa tenha
efetivamente razão.
Pelo fato de que a “legitimidade de parte” e a “possibilidade jurídica
do pedido” necessitarem de uma breve inserção no mérito
da causa, alguns autores têm defendido que a única condição
da ação é o “interesse de agir”.
Carlos Alberto
Frigieri
BIBLIOGRAFIA:
- AMARAL
SANTOS, Moacyr. "Primeiras Linhas de Direito Processual Civil", Volume I,
5ª edição.
- BARBI,
Celso Agrícola. "Comentários ao Código de Processo Civil",
Volume I, 1ª edição.
- CINTRA,
Antonio Carlos de Araújo. "Teoria Geral do Processo", 2ª edição.
- DINAMARCO,
Cândido Rangel. "Teoria Geral do Processo", 2ª edição.
- DINIZ,
Maria Helena. "Compêndio de Introdução à Ciência
do Direito".
- GRECCO
FILHO, Vicente. "Direito Processual Civil Brasileiro", volume I, 3ª edição.
- GRINOVER,
Ada Pellegrini. "Teoria Geral do Processo", 2ª edição.
- THEODORO
JÚNIOR, Humberto. "Curso de Direito Processual Civil", Volume I, 6ª
edição.
- SANTOS,
Ernane Fidélis dos. "Introdução ao Direito Processual
Brasileiro", 1ª edição.
CARLOS ALBERTO
MENEZES DIREITO
Sites interessantes:
Márcio
Túlio Viana Artigo extraído da Internet: www.gcsnet.com.br/~amatra3
Matéria
publicada na Revista LTr - Legislação do Trabalho nº 05,
volume 61, maio/1997, página 646 e CD de doutrina e jurisprudência
brasileira da Editora Plenum.
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Jurisprudência e Divulgação
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